quinta-feira, 29 de julho de 2010

O bar da estrada

Arranhou a porta que abriu com o vento, atravessou o salão e tocou-me no ombro.

Soprou as cortinas e saltou a janela.

Sombras gigantes dançam incessantes diante da frágil luz da vela.

Tremula e suplicante a pequena chama se contrai sob o açoite de respirações entrecortadas.

Porém nada se move... Nada se houve.

Meus convivas se calaram, não mais cantam nem se movem.

Tais como estátuas no cemitério, ídolos sem glória no infame altar da taberna.

Seus copos estão vazios, seus cinzeiros estão cheios e seus olhos estão secos.

Seus lábios balbuciam sem emitir som, nada dizem, nada declamam...

Não mais se contorcem em paixões febris, a loucura não mais cintila em seus olhos e o vinho não mais escorre da boca.

Pálidos e silenciosos encaramos uns aos outros a fim de encontrar olhares perdidos.

Extraindo do silêncio palavras esquecidas.

Lembranças insones obscurecem pensamentos e restos de sonhos tomam formas fantasmagóricas.

Assombrando corredores infestados de retratos.

Contando histórias de almas solitárias que aqui passaram e aqui me deixaram. . .


Alysson David Reis

terça-feira, 27 de julho de 2010

O estranho

No dia em que despertar e a porta estiver aberta, e a casa estiver vazia. Quando seus lençóis estiverem frios, quando não conseguir ouvir nada além de sua respiração e seus passos forem os únicos no longo corredor que o levará para longe de seu quarto seguro. Quando o último rosto amigo estiver pendurado na galeria morta sob a lareira que jamais crepitará. Quando os personagens de suas lembranças nebulosas lhe lembrarem de que estás só, quando retratos sujos lhe lembrarem de que um dia eu existi e então perceber que não estou mais aqui... Lembre-se de que eu sou você, e quando novamente se esquecer de mim apenas lembre-se de quem és porque eu sou você. E o estranho estará no espelho, meu rosto penduarado na parede descascada será teu único reflexo e na tua solidão terás medo de tua única companhia...

Eu sou todas as pequenas emoções confinadas em teu quarto úmido

Eu sou todas as pequenas visões na espessa fumaça

Eu sou a sombra dançante na parede

Sugue-me em tuas veias, absorve-me em tuas narinas, deixe-me contaminar teus olhos

Bebe-me, consome-me

Eu te violento de dentro para fora

Eu me misturo em teu sangue, impregno teus sonhos,

Alimento teus demônios,

Eu sastifaço tua dor

Eu sou a aparição em teu espelho, a respiração em teus ouvidos

O ruído no escuro

Eu me movo em teus lençóis

Eu respiro em teus poros, eu sou o sangue em teus olhos

Eu habito tua mente, eu danço em teus delírios,

Componho teus poemas

Eu sou a insânia, a morte, o fim...

Eu sou a criança flagelada, a infância molestada...

Eu sou teu choro contido.

por Alysson David Reis

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Rios vermelhos



Um conto soturno para uma criança solitária,
em um deserto gelado,
d
entro de uma noite sem fim.
Ondas raivosas devoram rochas antigas, um quadro surreal do horizonte mais belo.
Na praia mais distante ao fim da estrada mais longa.
No fim da mais saudosa história já escrita, onde a garrafa chega ao fim e o vinho derramado se mistura ao sangue corrente.
Figuras medonhas dançam na fumaça, olhos flamejantes surgem nas brasas.
Como anjos de fogo dançando no inferno.
Nuvens cinzentas regam terras mortas, flores sedentas brotam dentre ossos secos.
Lágrimas orgulhosas conduzem olhos altivos até tocar o chão ensanguentado...
Veias transbordantes percorrem a terra. Rios vermelhos contornam olhos inocentes, alimentam bocas secas e lavam mãos violentas. Deixe a fogueira arder, continuemos a dançar. Deixe que o espírito queime e a fumaça suba. Rios de sangue refletidos no céu avermelhado. A paisagem noturna, o berço do nada... Refletido em seus olhos e enterrado em seu peito.
Alysson David Reis

domingo, 18 de julho de 2010

A última noite na terra


E se a mente não retornar do sonho mais temido? E se não puder voltar de um gole mais fundo? E se não puder acordar depois de uma noite mais longa?

Quando as pupilas dilatarem e o clarão do fogo crepitante consumir os olhos

Quem cobrirá nossos rastros antes da loucura nos encontrar?

Pra onde iremos quando o dia se for e a noite não nos trouxer consolo?

Quem seremos nós quando o espelho esconder o rosto?

Siga a trilha de sangue e dançará em círculos...

Siga os passos do assassino e chegará lá sozinho.

Alysson David Reis

sexta-feira, 16 de julho de 2010

Não quero habitar seu coração mas a sua mente, como um pensamento que nunca morre, uma idéia suicida ou um impulso homicida, o desejo febril. Não quero ser lembrado mas irei lembrá-lo de seus temores, irei provocar os desejos que o torna louco e suscitar as lembranças que o torna sozinho.

Em nome da beleza brutal, do calor da pele e do sangue nos olhos, invoco tudo o que é visceral, violento e frágil. Tudo o que é viciante, erótico, sujo e obscuro, tudo o que é medonho, atraente e nocivo, tudo que é odioso, tudo que é fodido. Tudo o que é doloroso, carnal e belo. Sem honra, sem glória apenas o desejo, a satisfação e a overdose. Alimente o vício e morra de fome. Essa é a estrada para o inferno, ignore o destino morrer é só uma consequência de viver, dor é uma consequência de sentir e pesadelos são o preço da capacidade de sonhar. È preciso queimar para iluminar...


Alysson David Reis

segunda-feira, 12 de julho de 2010

20h30min e a noite acaba de abrir as cortinas, o céu esta estampado na janela e o inferno esta batendo a porta...

O copo esta vazio, o corpo quer parar e a mente quer sair para um drink em meio a fumaça ou uma dança em meio ao fogo. Sinos dobram dentro de minha cabeça anunciando o momento em que se abre a grande e pesada porta, deixando sair a luz que sonhamos encontrar ao fim do túnel lodoso deste esgoto a céu aberto. Mas é só o fogo do inferno reluzindo novamente, como uma lamparina nas mãos do ceifeiro conduzindo o moribundo no caminho das trevas. Olho para o chão buscando o reflexo das estrelas na poça suja, então sigo a luz até a grande porta. De dentro do clarão alguém me chama, eu caminho pra luz e então percebo que é apenas a lâmpada no teto de meu quarto. Sento-me a beira da cama e então percebo, somos todos crianças no escuro buscando um ponto luminoso dentro das trevas. As estrelas se distanciam da terra ao passo de que se aproximamos do fogo...

Acredito que o inferno é a eterna lembrança de nossa vida anterior, a eterna culpa queimando seus ossos. A visão de seus pecados se repetindo durante toda a sua eternidade. Como fantasmas que te visitam constantemente para lembrá-lo de quem você é e porque esta ali. Lembrá-lo de que existe um paraíso e que você jamais entrará lá, pois até o diabo sonha secretamente com o paraíso de dentro do inferno. Inferno é a eterna saudade de tudo e de todos que amou, a eterna saudade do que não lhe foi dado tempo de viver... a eterna consciência de que você poderia ter sido melhor.

Alysson David Reis

domingo, 11 de julho de 2010

A estrada perdida

Há estrelas no céu e fogo na terra... O vento esta em seus cabelos, o medo esta em seus olhos, o silencio esta em sua boca e o sangue em suas mãos. Ao fim da estrada que se estende na escuridão dois olhos fumegantes se aproximam furiosamente trazendo o brilho do fogo do inferno. As estrelas caem do céu, os anjos deixam a terra e o fogo se alastra nos campos. Sua respiração exala cheiro de carne queimada, os cães estão em seu rastro e a morte caminha a sua frente. Respirou fundo olhou para o céu e riu desesperadamente... Os olhos de fogo se aproximavam. Cavalgando ensandecido, um corcel tão negro quanto seu próprio coração e aquele terrível brilho infernal nos olhos. O medo e a insanidade percorriam seus nervos eletrificados, o cavalo negro estava apenas a alguns passos. Os olhos terrificados assistiram a sinistra criatura passar por ele e se distanciar cortando a fumaça que invadia a estrada. A face deformada pelo terror, os membros paralisados... As lágrimas saltaram dos olhos, os joelhos foram ao chão, a mão pressionou o peito com força, o suor gelado pingava da fronte.Caiu lentamente, virou de lado, olho para trás e viu o corcel ainda se distanciando enquanto os cães se aproximavam .Uma última lágrima caiu dos olhos, a mão trêmula se estendeu para o ar até cair e bater no chão.

Alysson David Reis

sábado, 10 de julho de 2010

Eu olho para trás e vejo um passado cada vez mais belo. Como dizia o poeta: "tenho saudades do que não vi,sinto a falta de dias que não vivi".Tenho desgosto de minha geração e o futuro já não guarda mais a esperança que os antigos tiveram em nós.Nosso futuro é fonte de terror e medo ao passo de que nosso passado nos deixou como legado a saudade e a dor de quem já viu dias melhores.Um dia ouvi uma frase em um filme que dizia: “todos temos nossas máquinas do tempo, as que nos levam ao passado são as lembranças e as que nos levam ao futuro são os sonhos.” E agora a sensação que tenho é a de que as lembranças são mais utópicas que os sonhos.
O presente é a prova definitiva de que os sonhadores que vieram antes de nós falharam. O que será então do futuro de uma geração sem sonhos.Não há mais poesia, a arte está deformada e o gênio criativo sufocado.Toda manifestação artística e qualquer demonstração de humanidade é severamente suprimida pela própria
juventude que um dia concebeu a arte.
Tenho nojo deste mundo.
Sou um estranho onde quer que esteja não pertenço a esta época. Ou pelo menos não queria pertencer. Minha arte não tem valor para quem é incapaz de interpretá-la, meus pensamentos estão entregues as paredes e minha alma a solidão. Em toda a minha vida eu fui punido por ser um pensador,fui perseguido e torturado por ser diferente.O preço de ter uma alma me concedeu talentos inúteis para o capitalismo e para socialização.E assim, meu direito natural a um lugar no mundo me foi tirado.E no fim agradeci por estar sozinho.Sozinho estou seguro, sozinho posso ser eu.Contudo não suporto olhar lá fora,tenho nojo de andar nas ruas,tudo me aborrece e a humanidade me causa asco(e eles nem sabem o que significa asco).A maioria das companhias humanas ou me irrita ou me fere, a maioria das atividades a que sou submetido ou me aborrece, ou me entristece ou me consome.Tudo é cansativo, estou cada vez mais desapegado da vida.Por hora é tudo o que sei,tudo o que consigo dizer ou sentir...

...adeus por agora.

Alysson David Reis